Por Lívia Borges
O som das notificações violam o silêncio. Mensagens invadem o horizonte que vemos pela postura levemente curvada. Lembramos o sol, vento, toque humano, debruçados pelas escolhas que os outros fizeram nos grupos das redes sociais a que pertencemos.
Cansados, tentamos nos livrar dos excessos, apagando o indesejado e favoritando algo a ser lido oportunamente. Um tempo que raramente chega. Pelo menos não para tudo que almejamos ter um depois. Os dias seguem, o tempo é gasto com o indesejável.
Indesejável? Tenho minhas dúvidas. Omissos de nós mesmos acompanhamos o ritmo dos tempos. Até que uma mensagem de autoajuda chega e temporariamente nos reposiciona. Respiramos fundo, pois em geral é o que se recomenda e repassamos adiante, cumprindo o dever de propagar ao menos algo positivo.
Mas onde estamos? A mente divaga entre o devir e o passado com todas as dualidades intrigantes de nossa humanidade. Mais uma noite se passa entre nascimentos, ameaças e vários tipos de mortes. Seguimos ignorantes. Lutando pela vida que sequer vivemos, ausentes de onde estamos. A ausência tem o preço correspondente à possibilidade de resposta, caso estivéssemos inteiramente em nós mesmos. Um estar que evoca a consciência de ser. Dessa inconsciência espera-se tudo.
Podemos pender de um lado para outro atendendo ao apelo conformista ante a mínima oferta de pertença, identidade, cisão, superioridade e, claro, violência, alienando-nos de uma visão mais ampla, inclusiva, menos monótona do que os discursos polarizados. Ousadia! Isso é quase uma sentença de despertencimento. Em que século estamos? À parte os avanços tecnológicos que transversalmente estão a mudar o modo como vivemos, a mente humana continua capaz das mesmas atrocidades e dissimulações para os sórdidos propósitos de poder registrados pela história.
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Texto originalmente publicado na coluna Opinião do Jornal de Brasília, 9/abr/2020.
Imagem de abertura - by Free-Photos.
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